domingo, 28 de março de 2010

O BELO DA SEMANA - SAUDADE

O texto do Professor José Antônio me remete a minha infância a as visitas que fazia com a minha avó. Me traz a lembrança um cheirinho bom de café, a sensação de perna cansada de tanto andar e a expectativa de saber o que a Tia Gaida, a Tia Geralda, a Tia Tueta ou a tia Dinah ia nos servir.
A Paula vai saber direitinho do que eu tô falando. Se o Cris ler, também!


Saudade

José Antônio Oliveira de Resende
(Professor de Prática de Ensino de Língua Portuguesa da Universidade Federal de São João del Rei)


Sou do tempo em que ainda se faziam visitas. Lembro-me de minha mãe mandando a gente caprichar no banho porque a família toda iria visitar algum conhecido. Íamos todos juntos, família grande, todo mundo a pé. Geralmente, à noite.

Ninguém avisava nada, o costume era chegar de paraquedas mesmo. E os donos da casa recebiam alegres a visita. Aos poucos, os moradores iam se apresentando, um por um.

– Olha o compadre aqui, garoto! Cumprimenta a comadre.

E o garoto apertava a mão do meu pai, da minha mãe, a minha mão e a mão dos meus irmãos. Aí chegava outro menino. Repetia-se toda a diplomacia.

– Mas vamos nos assentar, gente. Que surpresa agradável!

A conversa rolava solta na sala. Meu pai conversando com o compadre e minha mãe de papo com a comadre. Eu e meus irmãos ficávamos assentados todos num mesmo sofá, entreolhando-nos e olhando a casa do tal compadre. Retratos na parede, duas imagens de santos numa cantoneira, flores na mesinha de centro... casa singela e acolhedora. A nossa também era assim.

Também eram assim as visitas, singelas e acolhedoras. Tão acolhedoras que era também costume servir um bom café aos visitantes. Como um anjo benfazejo, surgia alguém lá da cozinha – geralmente uma das filhas – e dizia:

– Gente, vem aqui pra dentro que o café está na mesa.


Tratava-se de uma metonímia gastronômica. O café era apenas uma parte: pães, bolo, broas, queijo fresco, manteiga, biscoitos, leite... tudo sobre a mesa.

Juntava todo mundo e as piadas pipocavam. As gargalhadas também. Pra que televisão? Pra que rua? Pra que droga? A vida estava ali, no riso, no café, na conversa, no abraço, na esperança... Era a vida respingando eternidade nos momentos que acabam.... era a vida transbordando simplicidade, alegria e amizade...

Quando saíamos, os donos da casa ficavam à porta até que virássemos a esquina. Ainda nos acenávamos. E voltávamos para casa, caminhada muitas vezes longa, sem carro, mas com o coração aquecido pela ternura e pela acolhida. Era assim também lá em casa. Recebíamos as visitas com o coração em festa.. A mesma alegria se repetia. Quando iam embora, também ficávamos, a família toda, à porta. Olhávamos, olhávamos... até que sumissem no horizonte da noite.

O tempo passou e me formei em solidão. Tive bons professores: televisão, vídeo, DVD, e-mail... Cada um na sua e ninguém na de ninguém. Não se recebe mais em casa. Agora a gente combina encontros com os amigos fora de casa:

– Vamos marcar uma saída!... – ninguém quer entrar mais.

Assim, as casas vão se transformando em túmulos sem epitáfios, que escondem mortos anônimos e possibilidades enterradas. Cemitério urbano, onde perambulam zumbis e fantasmas mais assustados que assustadores.

Casas trancadas... Pra que abrir? O ladrão pode entrar e roubar a lembrança do café, dos pães, do bolo, das broas, do queijo fresco, da manteiga, dos biscoitos do leite...

Que saudade do compadre e da comadre!

6 comentários:

Unknown disse...

Oi Ju,
saudades ... de vocÊ, de MInas, de mineiridade ...
Bom esse nosso jeitinho, não é mesmo?!

Beijo
Rita Almico

Anônimo disse...

Juliana,
cafe quete com pão de queijo e... muita conversa. Coisa boa.
Luiz

Unknown disse...

Tudo a ver,ainda mais para curitibanos,hehe,mto legal mesmo.
Titai

ANA PAULA disse...

Ai que vontade de chorar... o tempo acabou ou isso é só uma desculpa para não vermos no que nos transformamos?

Anônimo disse...

A evolução nem sempre é pra melhor, uma pena perder essa proximidade com as pessoas...sempre podemos tentar reverter isso com os amigos queridos...quer eu te faço uma visita. Quero bolo, tortas e guloseimas. bjs Eliane

AnGeLo disse...

Apesar de uma aparente (falsa) formalidade, esta é a amizade genuína... sem convites, horarios pré-definidos, presentinhos... "tempo bom, não volta mais, saudade só o tempo faz (traz)"

Obrigado. Bjo!